data-filename="retriever" style="width: 100%;">Fotos: Renan Mattos (Diário)
Faltando três meses para o Natal de 2008, há pouco menos de 13 anos, uma antiga reivindicação da Região Central e da Fronteira - que parecia impossível de ser concretizada - saía do papel. Embrenhada no Pampa gaúcho, cortando plantações, pastos e a vegetação nativa, 114 quilômetros de uma precária estrada de chão deram lugar a um asfalto novo e bem-sinalizado. A BR-158, enfim, ganhou vida e deu espaço para um novo ciclo de desenvolvimento econômico para a região.
Desde a década de 1970 (confira na pág. 46), falava-se na construção da rodovia, que serviria de acesso direto entre Rosário do Sul, São Gabriel e Santa Maria. A viagem ficaria mais curta, o preço do frete diminuiria e, consequentemente, a circulação de bens e pessoas entre a Região Central e a Fronteira iria aumentar exponencialmente. Dez anos depois, na década de 80, ela começou a ser construída, mas as verbas insuficientes repassadas pelo governo federal não deram conta de manter um ritmo constante das obras.
A solução veio com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em 2007. Com mais dinheiro disponível, dois anos depois, o Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit) conseguiu entregar a rodovia completamente remodelada. Segundo o órgão, o investimento total foi de R$ 122 milhões. Em valores atuais, corrigidos pelo IPCA, o asfaltamento da estrada teria custado em torno de R$ 215 milhões aos cofres públicos. Como comparação, os 14,5 quilômetros da Travessia Urbana de Santa Maria foram orçados em R$ 309 milhões.
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Durante a semana, a reportagem percorreu os 114 quilômetros da estrada, saindo de Santa Maria, com um pequeno trecho duplicado, até o trevo de acesso a BR-290, entre Rosário do Sul e São Gabriel. No caminho, a boa sinalização no início e no final da estrada contrasta com a falta de tinta para delimitar a pista e a ausência de placas em alguns pontos da rodovia.
O bom estado de conservação é um chamariz para motoristas excederem a velocidade máxima permitida, que é de 100 quilômetros por hora, mesmo com as curvas sinuosas que fazem o traçado da rodovia. O movimento de caminhões, principalmente oriundos da Fronteira, impressiona. Em apenas uma das viagens, três caminhões cegonhas, em um comboio, passaram pela reportagem trazendo caminhonetes produzidas na Argentina. A distancia, com a rodovia, foi encurtada em, ao menos, 50 quilômetros, tornando-se uma importante ligação com a região fronteiriça.
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Outro cuidado são com os animais da rodovia. Não são raros casos ovelhas, vacas e cavalos pela pista, o que exige ainda mais alteração do motorista ao cruzar pelo trecho, principalmente em dias de neblina, algo que é corriqueiro no inverno.
Nas páginas a seguir, vamos mostrar os benefícios que o asfaltamento da estrada trouxe para a região, promovendo investimentos, empresas e encurtando caminhos de cargas e pessoas.
Um caminho mais curto para Santa Maria
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As cidades de Rosário do Sul e São Gabriel foram as mais beneficiadas com o asfaltamento da BR-158. A viagem até Santa Maria ficou mais curta, levando agilidade no deslocamento e desenvolvimento econômico aos municípios da região.
Com 39 mil habitantes, os rosarienses precisavam percorrer um caminho maior até chegar ao Coração do Rio Grande. A alternativa era seguir até Cacequi, pela ERS-640 e, depois, ingressar na ERS-241, perto de São Vicente do Sul, dobrar a direita e seguir até Santa Maria. O caminho era aumentado em, ao menos, 50 quilômetros.
- Vivemos um momento de muita espera e expectativa por essa questão da BR-158. Tínhamos uma dificuldade de locomoção rápida, pois somos uma cidade de muitos universitários que utilizam a rede de ensino de Santa Maria - destaca a o prefeito de Rosário do Sul, Vilmar Oliveira (PDT).
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Para São Gabriel, a realidade não foi diferente. Além do encurtamento da distância com Santa Maria, a cidade passou por um novo ciclo de desenvolvimento econômico, podendo, inclusive, angariar mais impostos. A explicação para o aumento da arrecadação municipal está na localização da BR-158. A maior parte da rodovia fica em solo gabrielense, atraindo investimentos, que se transformam em renda e investimento ao município.
- A nossa região, do centro em direção à fronteira, tem muitos municípios de maior extensão territorial. O asfaltamento ajudou muito no desenvolvimento da agricultura e agropecuária, já que esse seguimento precisa ter um escoamento da produção - afirma o prefeito de São Gabriel, Rossano Dotto Gonçalves (PL).
Um exemplo da prosperidade econômica é o centro de coleta de grãos, instalado pela Cooperativa Agrícola de Júlio de Castilhos (Cotrijuc) às margens da rodovia, no ano passado. O investimento total do complexo foi de R$ 13 milhões (confira mais detalhes na página a seguir).
- A rodovia foi determinante para a região. Ao longo desse trecho, tivemos muito investimentos, principalmente direcionados à soja - conclui Rossano.
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Homenagem
Em janeiro de 2018, o então presidente Michel Temer (MDB), sancionou a lei federal que denomina o trecho da BR-158 entre Santa Maria e Rosário do Sul como Rodovia Dr. Mário Ortiz de Vasconcellos. A proposta para nomear a via em homenagem ao ex-prefeito rosariense foi de autoria do deputado federal Paulo Pimenta (PT), formulada em 2012.
Mário Vasconcellos nasceu no dia 5 de abril de 1910, em Rosário do Sul e morou, também, em Santa Maria e Porto Alegre. Dr. Mário teve sua história contada no livro Rosário do Sul Através do Tempo - Apontamentos de Mário Ortiz de Vasconcellos, organizado por Mara Regina Miranda de Souza. Conhecido na cidade como Dr. Mário, ele foi prefeito, vereador e também presidente do Legislativo. Foi fundador e primeiro presidente do Rotary Club de Rosário do Sul, em 1938. Também exerceu a função de presidente da Associação Rural em 1935, 1962, 1964 e 1970.
114 quilômetros de desenvolvimento rural
O asfalto em meio a diversas estradas vicinais, típicas de interior. É assim que a BR-158 surge em meio a propriedades rurais e vias de difícil acesso para escoar a produção. Quem passa pela estrada e olha para os lados percebe o desenvolvimento rural da região. Entre plantações e a presença de bovinos e ovinos, a rodovia se tornou fundamental para o escoamento dos grãos produzidos nas propriedades do entorno.
- Estimamos que, na nossa região, tenha triplicado a produção de soja após a implementação da BR-158 - afirma o prefeito de São Gabriel, Rossano Dotto Gonçalves.
Em toda a Região Central, a área plantada de soja passou de cerca de 350 mil hectares, em 2010, para 1 milhão na última safra. O engenheiro agrônomo da Emater em Santa Maria, Luis Fernando Oliveira, afirma que é fundamental que exista uma rodovia asfaltada próxima às propriedades. Isso facilita o escoamento da produção e também reduz os custos do frete, já que os caminhões sofrem menos transtornos para acessar as localidades.
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- É claro que a instalação de uma rodovia, ainda mais neste período, em que a gente vive um crescimento do plantio de grãos, vai proporcionar condições de infraestrutura necessárias para que essa atividade se instale com mais velocidade - relata.
É tanta produção que estimula cooperativas de grãos a investirem em postos de coleta às margens da BR-158. A Cotrijuc foi uma delas. O investimento total no complexo foi de R$ 13 milhões, com capacidade de armazenar 240 mil sacas de soja.
- Começamos a acompanhar a expansão da lavoura de soja na região e, no ano passado, decidimos fazer a unidade naquela localização. A área plantada aumentou, e muito, ao longo da Faixa de Rosário - justifica o investimento o gerente comercial da Cotrijuc, Luiz César Moro.
Olivas
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Marco Aurelio Cunha planta olivas em São Gabriel
Com 12 mil árvores de oliva no interior de São Gabriel, o agricultor Marco Aurelio Cunha, 67 anos, acompanha a história da rodovia há mais de 40 anos. Ele recebeu a reportagem para conversar sobre os avanços que o asfaltamento trouxe para a região em uma simpática propriedade, bem cuidada e com diversas casas coloridas na sede. Com botas impermeáveis para se proteger da umidade e o cachorro ao lado, seu Cunha relembrou as dificuldades que passou na estrada antes de ela ser asfaltada.
- Me lembro de uma ocasião em que teve uma enchente muito forte. Tivemos que sair de trator até já perto de Santa Maria. Isso aqui era um fim de mundo - relembra.
Depois, o cenário se transformou completamente:
- Quando essa estrada saiu, mudou completamente a vida da região. Aqui não se plantava nada, não se tinha nada, apenas um pouco de pecuária. Com a estrada, veio a agricultura e houve a junção do crescimento da soja na nossa região. A medida que a soja foi plantada nesses solos arenosos, houve uma mudança total. Para nós, que temos os olivais, essa estrada se tornou vital. Caso contrário, não teria escoamento.
Economia para o transporte de cargas e pessoas
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Principal ligação com a fronteira do Uruguai, a BR-158 se tornou uma importante rodovia para o escoamento de grãos e também para o transporte de pessoas. Diminuição de tempo de viagem e, principalmente, de custos, fazem da via uma passagem obrigatória rumo ao extremo sul do país.
Presidente do Sindicado das Empresas de Transporte de Carga e Logística de Santa Maria, Rogério Brondani afirma que a ligação tornou-se fundamental para a entrega de mercadorias na Fronteira. Segundo ele, o caminho percorrido pelas encomendas segue, normalmente, um mesmo caminho: Porto Alegre, Santa Maria, BR-158 e a cidade de destino.
- A grande maioria das cargas chega até nós, em Santa Maria, onde distribuímos para a Fronteira, para as filiais das empresas, para chegar ao destino final. Para nós, o asfaltamento foi excelente. Diminuiu consideravelmente a quilometragem e com um asfalto em boas condições - relata.
Com sinais de retomada econômica, a expectativa, agora, é pelo aumento da demanda.
- Sem dúvidas, com a pandemia, o movimento diminuiu um pouco. Agora, está reaquecendo novamente. Estamos voltando ao normal e as empresas estão voltando a contratar - finaliza.
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Passageiros
Além de cargas, a rodovia se tornou o principal caminho até Santa Maria para passageiros vindos de Rosário do Sul e também de São Gabriel. O prefeito da Terra dos Marechais, Rossano Gonçalves, no entanto, reclama da queda do número de viagens diárias para Santa Maria oferecidas pela empresa de ônibus que atende o município. Atualmente, são duas viagens diárias, partindo da rodoviária às 8h50min e 15h30min.
- Existe a necessidade de linhas de transporte coletivo de forma mais seguida. Ela é muito eventual. Isso já foi levado para conhecimento dos órgãos competentes - afirma.
José Pedro Teixeira, diretor de operações da Planalto, responsável pelas linhas, explica que a empresa foi obrigada a diminuir o número de viagens diárias durante a pandemia em função das restrições impostas para tentar conter a Covid-19 que, consequentemente, diminuíram a demanda.
- Fechamento do comércio, aulas, escolas e faculdades. Isso diminuiu muito a demanda pelo transporte. Nós estamos sempre conversando com as prefeituras, câmaras de vereadores e ver o que eles precisam para visualizar qual o melhor momento para a retomada - explica.
Inclusive, como reflexo da pandemia, a tradicional empresa santa-mariense entrou com um pedido de recuperação judicial, no final do mês passado, para conseguir manter os empregos e o serviços prestados. Em nota, a Planalto afirmou que o principal motivo para o pedido foi a redução exponencial de passageiros em função da pandemia.
Uma das medidas da empresa durante a pandemia foi a implementação de uma linha entre Santa Maria e Uruguaiana que vai e volta no mesmo dia. O principal objetivo é a compra de produtos nos free shops da cidade brasileira,
- Esse trecho da BR-158 diminuiu bastante o percurso e melhorou a ligação entre Santa Maria e a Fronteira, principalmente para Uruguaiana. É uma rodovia em condições muito boa e, com isso, ela gera benefícios de quilometragem e também do tempo de viagem - destaca Teixeira.
Reclamação por excesso de velocidade e falta de policiamento
Como na maioria das rodovias, reclamações por excesso de velocidade e imprudência dos motoristas são comuns na BR-158. O problema fica ainda maior em um asfalto quase sempre em boas condições e uma via permeada de curvas.
- Existe um ausência absoluta de policiamento. Não tem ninguém aqui. O posto rodoviário de São Gabriel foi desativado e qualquer ocorrência está longe de tudo. Outro aspecto é que essa estrada é muito perigosa. Muitas curvas fechadas e, por vezes, mal sinalizadas - afirma o produtor rural Marco Aurelio Cunha, ao enfatizar que os problemas com o sinal de celular deixam a viagem ainda mais perigosa.
Durante a estrada, são raros os sinais de operadoras disponíveis. No trajeto de pouco mais de 100 quilômetros, a equipe viajou com equipamentos da Vivo e outo da Claro. A primeira empresa, ao longo do caminho, apresentava serviço, mesmo que fraco. O sinal era mais forte próximo à localidade do Pau Fincado. Já a Claro não apresentou sinal de celular em nenhum momento.
O chefe do Núcleo de Policiamento e Fiscalização da Polícia Rodoviária Federal (PRF) de Santa Maria, Daniel Pozzobon, relata que a estrada recebe a mesma atenção das demais atendidas pela polícia.
- A PRF, em Santa Maria, é responsável por diversas estradas, entre elas, a BR-158. O trecho recebe o policiamento idêntico aos demais - afirma.
Conforme Pozzobon, as principais ocorrências de acidentes no trecho entre Santa Maria e Rosário do Sul são casos de aquaplanagem de veículos antigos e sem as revisões necessárias.
- Elas normalmente ocorrem com o mal estado de conservação do veículo e, também, excesso de velocidade. Todo o condutor que for transitar a rodovia deve atentar para as condições do veículo, da rodovia e meteorológicas - conclui